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A blefarite, como o nome sugere, engloba todos os processos inflamatórios que ocorrem nas
pálpebras, associadosounãoà infeçãodasmesmas. Éumadaspatologiasocularesmaiscomuns
nomundo e está presente empraticamente todas as faixas etárias e raças
1
, e responsável pelo
desconforto ocular referido por milhões de indivíduos. As pálpebras são parte integrante da
UnidadeFuncional Lacrimal e responsáveispelamanutençãoda integridadeda superfícieocular
externa. Por conseguinte, a blefarite quando crónica e não tratada pode induzir algumtipo de
desarranjonos váriosmecanismos dedefesae colocar em risco a superfícieocular
2
e a visão. A
blefariteé, provavelmente, adoençaocularmais subvalorizada, subdiagnosticadae subtratada.
Neste capítulo são abordados os vários tipos de blefarite. A blefarite posterior, em particular
a disfunção das glândulas de Meibomius (DGM), temmaior destaque pela importância dada
atualmenteaos efeitosdas glândulasdeMeibomiusna superfícieocular.
GlândulasdeMeibomius
AsglândulasdeMeibomiusforamdescritaspelaprimeiraveznoséculoXVIIporHeinrichMeibom
3
.
São glândulas sebáceas localizadas nas placas tarsais das pálpebras, compostas por múltiplos
ácinos excretores dispostos circularmente em torno de um ducto central para o qual drenam
4
.
Osorifícios correspondentes estãodispostos ao longodasmargens palpebrais, anteriormenteà
linhadeMarxna junçãomucocutâneae separadospor intervalos regulares. Aobiomicroscópio,
é possível distinguir a arquitectura anelar característica, refletindo a disposição concêntrica do
orifício,mucosa, ácinosdistais, fibrasdosmúsculosdeRiolane tecido conjuntival glandular
5,6
.O
comprimentodasglândulasdeMeibomiusestá relacionadocomo tamanhodaplaca tarsal, pelo
que as suas dimensões variam consoante a porção do tarso, central ou periférica, na pálpebra
superiorou inferior
7
.Assim,onúmerodeglândulaspresentesnapálpebrasuperioréentre trinta
a quarenta, enquanto que na inferior é entre vinte a trinta. O seu comprimento varia entre os
2 mm na pálpebra inferior e os 5.5 mm na porção central do tarso superior
8
. Está ainda por
determinarqual a contribuição funcional relativadas glândulasde cadaumadaspálpebraspara
o filme lacrimal. As glândulas deMeibomius, ao contrário de outras glândulas sebáceas, não
entramem contactodireto comos folículospilosos.
As glândulas de Meibomius são densamente inervadas e a sua função é regulada através
da estimulação neurológica (neurotransmissores), hormonal (androgénios, estrogénios,
progesterona) edeoutrosmediadores (fatoresde crescimento, ácido retinóico). Aexcreçãodos
lipídeos faz-se para pequenos reservatórios nas margens palpebrais
7
a partir dos quais, com
o movimento mecânico do pestanejo, a camada lipídica do filme lacrimal (CLFL) é renovada.
O meibum é uma mistura complexa de colesterol, ésteres de colesterol, fosfolipídeos com
pequenas quantidades de triglicerídeos, triacilglicerol e hidratos de carbono
9,10
. À temperatura
ambienteapresenta-senoestado líquidoe, quandoexcretadoem indivíduos saudáveis,mostra-
se como um fluido quase transparente
9
. Atualmente, pensa-se que a CLFL seja composta por
váriosestratos, emqueomais superficial éconstituídopor lipídeoshidrofóbicosounãopolares,
colesterol, esterol e ceras esterificadas, que impedem a evaporação da lágrima. O estrato
subjacente é constituído por lipídeos hidrofílicos ou polares, esfingomielina, fosfatidilcolina e
fosfatidiletanolamina, que atuam como surfactante e estão diretamente relacionados com o
Blefarites
VascoMiranda, PauloTorres